COMENTÁRIOS
INICIAIS:
Se é verdadeira a afirmação de que os beneditinos
foram os mais importantes representantes das associações monásticas no que se
refere à arte da construção, é possível concordar também com a opinião do Ir.’.
Jorge Carlos Marasco, prefaciador de uma das obras do Ir.’. Eduardo R. Callaey,
quando ele mencionou que essas associações constituem uma das fontes mais ricas
e talvez menos exploradas daquelas até agora conhecidas, para as quais,
felizmente, alguns renomados pesquisadores já vem se debruçando em suas
pesquisas relativas às origens da Maçonaria nos últimos tempos.
Como também fica difícil não concordar
com a posição do Ir.’. Theobaldo Varoli Filho, quando disse que a revelação da Maçonaria
ocorreu na Idade Média avançada, com ênfase para o período da Arte Gótica e onde
houve um grande impulso na construção de catedrais.
Ainda, conforme este último, as
associações monásticas chegaram a monopolizar as principais profissões,
fundamentalmente, aquelas ligadas a arte da construção, além de contratarem
profissionais leigos. Estes últimos viriam a separar-se, depois de um longo
tempo depois, desses monges, dando continuidade à expansão da arte gótica.
Ainda, no que se refere às associações
monásticas, o Ir.’. Varoli Filho era da firme opinião de que não seria possível
separar a Maçonaria, nem dos beneditinos e nem dos que vieram depois, os
cluniacenses e os cistercienses.
Lembremos: a Ordem de São Bento ou dos
Beneditinos foi instituída no ano de 527.
A Abadia de Cluny e os cluniacenses em
910.
Por sua vez, a Ordem de Cister ou dos
Cistercienses surgiu em 1098.
DA
INFLUÊNCIA CLUNIACENSE NA ALEMANHA E NA INGLATERRA
Além dos aspectos gerais relativos às
reformas que foram promovidas pelos beneditinos e a criação de duas novas
ordens, cluniacenses e cistercienses, na sequência haverá uma complementação que
nos dará a dimensão das influências dos beneditinos, nesse caso,
especificamente dos cluniacenses.
A antiga Abadia de Hirsau, construída entre
830 e 837, a partir do ano 1069, adotou práticas cluniacenses.
E foi para entendermos um pouco melhor em
que consistiu essa ligação que compreendeu o monaquismo e a Maçonaria, que o Ir.’.
Varoli Filho, no que diz respeito à Abadia de Santo Aurélio de Hirsáugia, em
Hirsau, Wurtenberg, teceu algumas das suas considerações. Transcrevemos o
seguinte parágrafo do seu “Curso de Maçonaria Simbólica”:
“A abadia de Hirsau era uma
irmandade não só de monges, como também de pedreiros e construtores, que
Wilhelm (abade Wilhelm, Conde de Scheuren, o que dirigia Hirsau, a partir de
1069) acolheu, integrando-os numa fraternidade que nada fica a dever a uma
verdadeira loja maçônica. Por isso, bons autores chegaram a acreditar que o
convento e abadia de S. Aurélio de Hirsáugia (como foi chamado nos livros
antigos), por seus regulamentos e práticas, tenha sido, pelo menos nos tempos
do abade Wilhelm, uma das primeiras lojas maçônicas do mundo. “ (Varoli Filho,
1977, pág. 206)
Mas, assim como Cluny influenciou as
construções religiosas na Alemanha através de Wilhelm Von Hirschau, o mesmo também
aconteceu na Inglaterra com a atuação do construtor de nome Lanfranco
(1005-1089).
Conforme o Ir.’. Eduardo R. Callaey,
após a conquista da Inglaterra pelos normandos em 1066, o duque Guilherme
(1028-1087) convocou Lanfranco e instalou-o como arcebispo de Canterbury, lugar
onde Lanfranco faria seus projetos e organizaria suas grandes obras para os
normandos.
A partir do ano 1070, sob a sua inteira
supervisão, foram erigidas as primeiras construções monumentais de arte
românica inglesa. Havia uma grande quantidade de catedrais e igrejas em construção
na ilha britânica nessa época, e à frente de muitas delas estavam os
beneditinos.
Catedrais importantes, a exemplo de
Canterbury, Sherbone, Winchester e Worcester eram governadas por beneditinos,
enquanto algumas outras tinham estes últimos como seus mestres de obras:
Herfast, em Norwich; Guilherme, em Durham.
Gundulf (cerca 1024-1108) era um dos
mestres construtores. Gundulf era protegido de Lanfranco: foi elevado ao cargo
de bispo de Rochester e nomeado mestre de obra. Ele construiu a catedral de
Rochester e a Torre Branca de Londres(22), esta última considerada a
primeira torre de pedra retangular da Inglaterra. Muito provavelmente construiu
a de Colchester também.
DAS
ASSOCIAÇÕES MONÁSTICAS ÀS CONFRARIAS LEIGAS E ÀS GUILDAS
Relativamente às datas que aparecem
acima, elas ajudam a entendermos que foi no período compreendido entre os
séculos VI e VII que praticamente deram entrada no cenário as associações
monásticas, onde seus construtores se dedicavam à edificação de igrejas e
conventos.
Sempre lembrando que: do século VI (501
ao 600) ao século IX (801 ao 900), numa Europa cristã, tivemos os seguintes
acontecimentos marcantes:
_ Fim do Império Romano do Ocidente
_ Invasões Bárbaras
_ Afirmação do Cristianismo no Mundo
Bárbaro
_ Segunda onda de invasões (Séc. VII ao
séc. X)
O Ir.’. Paul Nadon (1915 – 2001), historiador
francês, em seu clássico “A Franco-Maçonaria”, contribui com informações relevantes
acerca dos primórdios da Maçonaria e que tem como pano de fundo os
acontecimentos citados anteriormente.
Ao se debruçar sobre o assunto, o
historiador primeiramente citou os nomes daqueles arquitetos dignos de memória,
que eram também clérigos e que podem ser considerados como detentores das
tradições e dos segredos dos collegia romanos. Ele cita os seguintes
nomes: Leão e Gregório, bispos de Tours; Ferréol, bispo de Limoges; Dalmacio,
bispo de Rodez; Agrícola, bispo de Chalon-sur-Saône; Frutuoso na Espanha, e Santo
Elói, este último ao qual ele se refere como “acima de todos”.
Lembremos ainda que, anteriormente, na
Parte VII desta série, extraídos de um artigo do Ir.’. António Rocha Fadista,
foram citados também vários nomes de mestres notáveis que comandaram trabalhos relativos
ao erguimento de igrejas e templos, e que foram atuantes dentro desse tipo de
associações na Inglaterra.
Por sua vez, os outros nomes que agora apareceram,
como é fácil constatar, são de franceses e espanhóis.
Voltando ao texto do Ir.’. Paul Nadon,
veremos na sequência um trecho que facilita na compreensão dos estilos
arquitetônicos adotados na época, e serve também para complementar o pouco que
havíamos visto sobre o assunto. Há uma relação direta com os nomes dos últimos mestres
citados e que tiveram sua atuação na França e Espanha. Vejamos:
“Estes mestres foram formados nos
antigos reinos dos Godos e dos Burgúndios onde se conservara a arte de
construir. Talvez não se deva buscar noutra parte a origem do termo gótico que,
de fato, remonta a uma época muito mais antiga do que a arte que atualmente
designa. Já o encontramos escrito por Friedegodo, historiador que escrevia em
950. Continuou seguidamente a ser utilizado para designar o que nós chamamos de
arte românica, a qual se distinguiu mais tarde do novo estilo de ogiva por
designações de gótico antigo e gótico novo. Além do mais, este não passa de
evolução do precepeso da abóbada. Não há igualmente oposição entre os artistas
góticos e os artistas românticos.” (Nadon, 1977, pág. 26)
Dando prosseguimento: nos séculos XI e
XII começa a aparecer um novo tipo de associações, sendo que, elas foram praticamente
constituídas fora dos conventos: são as confrarias leigas. Elas são
também o esboço das futuras comunidades de ofícios.
Para esse acontecimento ou para essa
transformação, o Ir.’. Nadon atribui como algumas das prováveis causas: a
imigração dos artesãos para locais fortificados, uma garantia de maior
segurança em relação aos bens, a crescente paz, o cosmopolitismo comercial produzido
pelas expedições normandas e pelas cruzadas, entre outras.
A confraria poderia ser definida
como uma continuação da associação monástica, tendo se adaptado às novas
necessidades. Na realidade, mesmo sendo composta por leigos, o fundamento da confraria
é sempre sagrado, eis que, a religião penetra toda a vida profissional e o
clero está sempre presente.
Nadon é bem explicito nesse ponto: os
mestres leigos (João de Orbais, Vilardo de Honnecourt, Pedro de Corbie) são
simplesmente os alunos dos mestres eclesiásticos e destes últimos eles receberam
segredos e uma tradição.
Ocorreu que o saber acabou se
vulgarizando e, os mestres-de-obras leigos em seguida acabaram ultrapassando em
número os artistas eclesiásticos.
Resumindo: a associação monástica
tornou-se confraria quando o convento perdeu o seu status de centro de
segurança, de atividade e de ciência, ou seja, a partir do momento em que essa
função foi devolvida à cidade.
O Ir.’. Nadon viu também nessa
transformação, tratar-se apenas da criação de um quadro jurídico, o qual surgia
como uma resposta para uma situação social que se modificara bastante.
Ainda, nessa época, como uma
característica dos países germânicos e anglo-saxões, é quando começa a surgir uma
outra forma jurídica de associação, a qual permitiu aos trabalhadores manuais que
formassem agrupações autônomas: as guildas.
Na verdade, havia registro de que a
partir do século VII já teriam começado a aparecer as guildas religiosas
e sociais.
E a partir do século XII, surgem as guildas
de mercadores e artesãos.
Tanto no caso das confrarias,
quanto no das guildas, nascidas inicialmente como religiosas e depois
passando a ser de proteção e mútua assistência, pouco a pouco, foram se
estendendo no campo das suas atribuições, acabando por elevarem-se à categoria de
autênticos corpos profissionais. Esses ofícios eram regrados pela autoridade
municipal ou senhorial, e mais tarde, na França, por exemplo, o poder régio
acabou dando-lhes apoio, tanto que, em 1268 são redigidos os Estabelecimentos
dos Ofícios de Paris, chamado também Livros dos Mesteres, ou seja, a
codificação dos estatutos das confrarias parisienses.
CONFRARIAS,
CORPORAÇÕES, GUILDAS... DESFAZENDO CONFUSÕES
Um outro trecho que aparece no capítulo
destinado à Franco-Maçonaria Operativa, do livro de Nadon, traz luz no sentido
de esclarecer as diversas terminologias empregadas relacionadas às associações,
as quais por vezes acabam causando algumas confusões. O trecho é bastante
elucidativo, e contempla as terminologias, tanto da França como da Inglaterra, ao
qual nos referimos, é o seguinte:
“Quando a profissão se organiza,
a palavra utilizada na origem, em França, é a de confraria. Mais tarde
distingue-se entre a confraria, de função religiosa e social, e o mester,
organismo profissional. Mas o mester tem sempre a acompanhá-lo uma confraria e
tomará mais tarde o nome de comunidade de mester e enfim, no século XVIII,
simplesmente o de corporação. Na Grã-Bretanha, vamos encontrar primeiro o termo
geral de guilda, depois os de companhia e de fraternidade (a Companhia dos Pedreiros
de Londres é citada em 1376, a Fraternidade dos Pedreiros em 1472). Quanto ao
termo francês compagnonnage, é simplesmente impróprio. Os ‘compagnonnages’ não
aparecem antes do século XVI e, como o nome indica, agrupavam apenas companheiros
ou operários. Tratava-se essencialmente de associações de defesa dos seus
interesses próprios. A franco-maçonaria, não deriva delas de modo nenhum, mas uma
e outra organizações nasceram dum tronco comum.” (Nadon, 1977,
págs. 28-29)
COMENTÁRIOS:
Ainda nem entramos praticamente no
assunto guildas, porém, aproveitemos esta breve menção à Grã-Bretanha e
à essa terminologia, já que em Maçonaria quando ouvimos falar em guildas, o
nome parece estar associado sempre à Inglaterra, e isso se deve a que foi nesse
país que ele passou a ser mais utilizado primeiramente, depois, as outras
terminologias companhia e fraternidade.
Vamos atermo-nos um pouquinho às datas que
foram citadas no texto: 1376 e 1472. As origens da Maçonaria tidas como mais
aceitas, possuem uma relação direta com o que acabamos de escrever: às guildas
e à Inglaterra. Considerando essas datas (vamos arredondá-las um pouco só, no
intuito de facilitar nossas contas), temos então: 1400 e 1500.
Se é possível atribuirmos e concordarmos
que nesse período já existe uma franco-maçonaria, poderemos deduzir daí que a
Maçonaria tem a idade aproximada de pouco mais de 600 anos.
Ainda em relação às origens da
Maçonaria, a última frase que apareceu no extrato acima, acabou ecoando também como
uma resposta para uma das perguntas que constaram no título geral deste
trabalho, eis que, o autor assim se manifestou: “a franco-maçonaria não deriva
delas de modo nenhum, mas uma e outra organizações nasceram dum tronco comum.”
(Ele está falando a respeito de associações de defesa dos seus interesses
próprios.) Será que não podemos dizer, no que diz respeito às origens da
Maçonaria, que as guildas são uma das tantas organizações que pertencem a esse
tronco comum que responde pelas origens da Maçonaria, tal como as outras tantas
que vimos?
AS
GUILDAS: ORIGENS
No primeiro dos seus livros “Maçonaria
História e Filosofia”, ao abordar o assunto das guildas, o Ir.’ Ambrósio Peters
dá início com a seguinte pergunta:
“Havia guildas de maçons na época
do rei Athelstan? Estamos certos, que sim.” (Peters, 1999, pág. 74)
A história diz que o rei Athelstan, foi
um grande legislador, legislou para todos os cidadãos: civis, militares e
eclesiásticos, e que foi também um competente administrador, sendo que,
organizou os serviços públicos de maneira modelar, incentivou a cultura, enfim...
Para o Ir.’. Ambrósio Peters, soa coerente
deduzir a partir disso tudo, que um rei com esse histórico não poderia deixar
de ter organizado também em associações específicas, os numerosos talhadores de
pedra do seu reino, os maçons, colocando-os sob o controle de uma organização central
superior, o que poderia ser comparado a uma grande loja, se usando de uma
expressão maçônica da atualidade. E faz uma outra pergunta: “Seriam essas as
guildas dos maçons de que fala tão claramente no Manuscrito Régio?”
No intuito de reforçar ou confirmar as
suas inferências com relação à antiguidade das guildas na Inglaterra, o Ir.’.
Peters recorre à seguinte passagem do Livro “Idade da Fé” (pág.562) do grande
historiador estadunidense Will Durant:
“Ao norte dos Alpes a destruição
dos antigos collegia foi presumivelmente mais completa do que na Itália. Não
obstante, encontramo-los mencionados nas leis de Dagoberto (631), nas
capitulações de Carlos Magno (779-789) e nas ordenanças do arcebispo Hincmar,
de Reims (852).”
E para comprovar ainda mais o que foi
dito até aqui, a “Enciclopédia Britânica” diz que as guildas se desenvolveram praticamente
em todos os países europeus, no entanto, as primeiras evidências, as quais foram
devidamente corroboradas, são provenientes da Inglaterra, onde teriam surgido a
partir do século IX, sendo que, na segunda metade deste século, durante o
reinado de Alfredo, o Grande, a sua existência pode ser provada.
Agora, vejamos um trecho de um outro
livro “Maçonaria Verdade e Fantasias”, também de autoria do Ir.’. Ambrósio
Peters, no qual ele escreveu assim:
“Entre os séculos X e XIX houve
um período inicial em que a sociedade emergiu da barbárie e se reestruturou.
Foi o momento em que surgiram na Inglaterra as primeiras guildas maçônicas dos
operários construtores que conhecemos como Maçons Medievais. No século XI
surgiram, também na Inglaterra, as demais guildas de artes e ofícios no bojo da
introdução de novas técnicas comerciais trazidas pelos reis normandos.” (Peters,
2002, pág. 26)
Como podemos perceber, o Ir.’. Peters
costumava usar a expressão” guildas de maçons”.
CONTINUA...
NOTAS:
Torre Branca de Londres(22): é
uma antiga fortaleza e torre central da Torre de Londres. Foi construída por
Guilherme, o Conquistador no início da década de 1080, e depois aumentada. O
ponto mais forte do castelo, do ponto de vista militar, serviu de alojamento
para o rei e seus representantes, além de uma capela. Henrique III foi quem
ordenou que ela fosse caiada, em 1240. (fonte: wikipedia)
Ir.’. José
Ronaldo Viega Alves
Loja Saldanha
Marinho “A Fraterna”
Oriente de S. do
Livramento, RS
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