Stefano D.
Neste artigo, tentamos compreender um
aspecto muitas vezes esquecido da Maçonaria através da analogia de uma rede de
restaurantes fictícia, chamada “Da Hiram”.
“Da Hiram”, assim como muitas lojas
maçônicas, oferece um cardápio imutável, composto de rituais e procedimentos
repetidos mês após mês, ano após ano. Os “clientes”, os maçons, sentam-se às suas
mesas, assistem à recitação de rituais, participam em tediosos debates sobre
questões financeiras e cumprimentam-se segundo uma etiqueta rígida.
Esta experiência, semelhante a uma
refeição branda, não atende às necessidades dos “clientes” mais jovens que
desejam uma experiência mais envolvente e significativa. Sua decepção faz com
que abandonem "Da Hiram", assim como muitos jovens maçons deixam as
lojas.
N o cenário gastronômico, onde a
concorrência é intensa e a atenção do cliente é fragmentada, surgem marcas
capazes de se comunicar de forma autêntica e envolvente. Uma cadeia de
restaurantes destacou-se com um slogan simples e poderoso: “Pegamos boa comida
e tornamo-la melhor”.
A força deste slogan reside no seu
imediatismo. Sem jogos de palavras complexos ou promessas exageradas, apenas
uma declaração sincera que ressoa com a experiência universal de saborear a
comida.
O slogan celebra o amor pela comida de
qualidade, valor partilhado por muitos. Não se trata apenas de satisfazer a
fome, mas de elevar a experiência gastronômica ao próximo nível.
As palavras “nós melhoramos” sugerem um
compromisso contínuo por parte da cadeia de restaurantes para melhorar
continuamente a sua oferta. Uma mensagem que atrai clientes que valorizam a
dedicação à qualidade e buscam experiências culinárias cada vez mais refinadas.
Quem resistiria ao fascínio de um slogan
que promete transformar a “boa” comida em algo ainda mais especial? A rede de
restaurantes convida os clientes a descobrir um mundo de sabores intensos e
requintados, onde cada prato é uma obra de arte culinária.
A simplicidade e autenticidade deste slogan fazem dele um exemplo eficaz de comunicação eficaz na indústria da restauração. Uma mensagem que conquista o coração e o paladar dos clientes, fidelizando-os e atraindo novos paladares curiosos em experimentar a excelência. O ambiente era convidativo: um lugar acolhedor, cheio de sorrisos e da conversa de pessoas que pareciam estar saboreando uma deliciosa refeição. Atraído pelo slogan cativante “Nós pegamos boa comida e a tornamos melhor”, decidi experimentar este restaurante tão alardeado.
Infelizmente, a ilusão logo desmoronou.
O interior, embora bem conservado, tinha mesas e cadeiras frágeis que
precisavam de manutenção.
A decoração era kitsch e sem
originalidade, criando uma atmosfera nada refinada.
A atitude da equipe estava longe de ser
amigável. Os garçons discutiam entre si, demonstrando pouca atenção aos
clientes. Os tempos de espera foram bíblicos e, quando finalmente os pratos
chegaram, a desilusão foi total. A comida, considerada excepcional, era
insípida e, em alguns casos, absolutamente intragável.
Apesar da má qualidade da comida e do
serviço, o restaurante estava cheio de clientes sorridentes e aparentemente
satisfeitos. Teriam sido vítimas do mesmo engano ao qual eu sucumbira?
Ou será que o medo de expressar um
julgamento negativo num ambiente “exclusivo” os levou a fingir apreciação?
Ansioso para não estragar a noite meus
amigos, tentei terminar a refeição, lutando contra a náusea e a decepção. Cada
mordida era um sacrifício, acompanhado de um sorriso forçado que mal escondia
minha frustração.
Com uma pitada de esperança, decidi dar
outra chance ao local.
Ao retornar em outra noite, notei
imediatamente uma atmosfera familiar: os mesmos doze clientes do mês anterior
estavam lá, envolvidos em uma acalorada discussão sobre qual garfo usar para a
salada e a maneira correta de segurar uma taça de vinho.
Pareciam uma seita de paladares
requintados, guardiões de um saber gastronómico antigo e inatingível.
O gerente, como na minha visita
anterior, estava ocupado atendendo com deferência um grupo de executivos
corporativos sentados em uma mesa privada nos fundos. Ficou claro que sua
prioridade era obter a aprovação para uma promoção cobiçada, em vez de cuidar
da nova experiência do cliente. Ignorado pelo gerente e cercado por esses
“especialistas em etiqueta alimentar”, pedi novamente uma refeição. A esperança
de que a comida finalmente cumprisse as suas promessas foi miseravelmente
destruída pela realidade: o prato era mais uma vez insípido, enfadonho e
desprovido de qualquer brilho culinário.
Enquanto eu lutava cada pedaço, os frequentadores devoravam seus pratos com um gosto aparentemente genuíno. Foram eles os cúmplices do realizador nesta farsa culinária? Vítimas de gosto opaco ou simples marionetes num teatro de falso refinamento?
A confirmação da minha decepção foi esmagadora. A “comida de melhor qualidade” do restaurante era apenas uma ilusão, uma armadilha para paladares ingênuos atraídos por um slogan promissor, mas vazio.
Um lampejo de esperança me atravessa:
talvez conseguisse convencer o gerente a fazer pequenas mudanças, a melhorar a
comida que, embora boa, não cumpre o que promete. Mas o medo toma conta de mim:
seria rejeitado com frases banais como “sempre cozinhamos assim” ou “os
clientes não gostaram das nossas propostas inovadoras”. E, com resignação, já
imagino a resposta definitiva: “a direção central nunca permitiria”.
Reprimindo a vontade de expressar minhas
dúvidas, lembro-me do velho axioma empresarial: “o cliente tem sempre razão”.
Mas neste caso, meu motivo não importa.
Em vez de lutar contra um sistema que é
surdo às minhas críticas, decido abandonar a batalha. Pago a conta, cancelo
reservas futuras e prometo nunca mais voltar. Eu me pergunto como um
restaurante tão medíocre pode sobreviver, como os mesmos doze clientes podem
desfrutar tanto de comida insípida e sem imaginação.
A resposta é simples: eles gostam do
jeito que é. E o restaurante continuará a oferecer a sua mediocridade enquanto
for gerido por pessoas que preferem a rotina à inovação e enquanto os clientes
estiverem satisfeitos com o que sabem, sem ousar desejar algo mais.
Afasto-me resignado, consciente de que estou preso num sistema que não tem intenção de mudar. A minha experiência é um alerta para todos aqueles que se deparam com uma realidade imóvel, onde a crítica construtiva é sufocada pela rotina e pelo medo de ousar.
O
“Menu Maçônico”
E então chegamos a um problema difundido
dentro da Maçonaria hoje.
A discrepância entre a imagem pública de
“uma organização que torna as pessoas melhores” e a realidade vivida por muitos
membros que se sentem desiludidos e traídos. Um jovem maçom, num fórum online,
expressou amargamente: “Sinto que fui enganado”. Esta desilusão é
particularmente preocupante considerando que a Verdade é uma das três virtudes
cardeais da Maçonaria. Como pode uma organização que se baseia na busca da
verdade enganar os seus membros, especialmente os mais jovens e idealistas?
Para atrair novos membros de uma forma
honesta e transparente, a Maçonaria deveria reconsiderar a sua mensagem
publicitária. Em vez de enfatizar promessas vagas e idealizadas, deveria focar
nos valores concretos que oferece: a fraternidade, a busca pelo conhecimento e
o autoaperfeiçoamento. A Maçonaria deve ser aberta e transparente sobre os seus
princípios, práticas e expectativas. Os membros potenciais devem ter acesso a
informações claras e completas sobre o que a Maçonaria oferece e o que exige de
seus membros. Somente através de uma abordagem honesta e transparente a
Maçonaria será capaz de superar a crise de imagem que enfrenta e atrair novos
membros que compreendam e apreciem a experiência complexa e gratificante que
oferece.
É profundamente preocupante que um jovem
maçom, depois de apenas um ano como membro, se sinta enganado da organização. A
sua decepção, expressa na frase “Esta não é a Maçonaria em que me inscrevi”,
resume o cerne do problema que assola a instituição: a discrepância entre as
suas promessas e a realidade vivida pelos seus membros.
Esta questão é crítica para o futuro da
organização. Se a Maçonaria continuar a promover-se como uma “fábrica de
pessoas melhores”, mas não conseguir satisfazer esta expectativa, corre o risco
de perder a confiança dos jovens e não para atrair novos membros.
Talvez uma mensagem mais realista e
concreta, descrevendo o que a Maçonaria realmente oferece (fraternidade, busca
de conhecimento, aprimoramento pessoal) pudesse ser mais eficaz no
recrutamento. A frase "Maçonaria - pegamos pessoas boas e as fazemos
sentar em uma sala e ouvir a leitura de atas e debates de 45 minutos sobre como
gastar 50 euros e se deveríamos ou não publicar um artigo para demonstrar como
somos pessoas excepcionais" pinta um quadro pouco inspirador e longe do
ideal de crescimento e melhoria pessoal que a Maçonaria deveria representar.
É triste notar que as tentativas de
alguns “jovens irmãos” de inovar e melhorar a experiência dentro das lojas
muitas vezes encontram resistência. A Maçonaria parece incapaz de se adaptar ao
mundo em mudança e de responder às necessidades dos seus membros mais jovens.
O compromisso de tornar as pessoas
melhores através do auto-aperfeiçoamento, muitas vezes alardeado pela
Maçonaria, corre o risco de soar vazio se não for traduzido em ações concretas.
Poucas lojas aplicam as ferramentas de trabalho para educar os jovens membros
sobre como empreender este caminho de crescimento.
Um documento intitulado "É uma
questão de tempo" está circulando online e, não tendo acesso direto a ele
e não podendo verificar a fonte oficial, não posso citar explicitamente o texto
ou atribuir as ideias nele expressas a autores específicos ou organizações.
O tema central deste documento é a
definição da verdadeira identidade maçônica. Sublinha-se que a identidade de um
maçom não se limita a símbolos, como o esquadro e o compasso, mas reside na
experiência de vida de cada indivíduo, no seu constante empenho em melhorar-se
a nível físico, intelectual e espiritual.
O documento destaca alguns desafios que
a Maçonaria deve enfrentar como a crise de identidade entendida como uma
discrepância entre a imagem pública e a realidade vivida pelos membros que gera
confusão e decepção; a falta de atratividade para os jovens e a resistência às
mudanças, evidenciando como a organização tende a resistir às inovações e novas
ideias.
No entanto, o documento também sugere
soluções concretas para superar estes desafios: comunicação clara e
transparente sobre a sua verdadeira identidade e os valores que representa; a
abertura e a inclusão que a Maçonaria deve ter ao abrir-se a novas ideias e
acolher pessoas de todas as origens e origens; dar maior espaço e voz aos
jovens membros, incentivando-os a contribuir com as suas ideias e energia.
Cada maçom tem a responsabilidade de
descobrir a sua própria vocação dentro da organização, de encontrar o seu lugar
na sua rica história. Esta busca por significado e propósito deve estar no
centro da nossa experiência maçónica, impulsionando-nos a experimentar a
Maçonaria de uma forma autêntica e significativa.
A ênfase excessiva colocada no ritual em
O século XX distorceu parcialmente a essência da Maçonaria. A ideia de que o
ritual é o elemento central da educação maçônica, a única ferramenta de
transmissão dos valores da irmandade, criou uma espécie de inércia dentro das
lojas.
A analogia da rede de restaurantes
destaca perfeitamente esse problema. As lojas, assim como os restaurantes que
servem sempre o mesmo cardápio brando, não evoluem, não se adaptam aos tempos e
às necessidades de seus “clientes”, os maçons. A repetição de rituais e
procedimentos, sem aprofundar o seu significado e sem aplicar os seus
princípios na vida quotidiana, cria uma experiência estéril e pouco envolvente.
Quando um jovem maçom, após ser
iniciado, elevado e participar das atividades da loja, decide sair, ele não é
simplesmente um “cliente insatisfeito”.
Sua decepção é um sinal de que algo não
está funcionando, que a Maçonaria não está oferecendo o que ele precisa para
crescer e melhorar como pessoa.
A Maçonaria possui uma longa história
rica em valores universais. A sua “receita” original, baseada na busca da
verdade, do aperfeiçoamento pessoal e da fraternidade, ainda hoje é válida. No
entanto, como qualquer receita, necessita de ser reinterpretada e adaptada aos
tempos, utilizando ingredientes frescos e inovadores.
É preciso abandonar a atitude dos
“cozinheiros teimosos” que agora se apegam aos métodos superar. Em vez disso,
precisamos de abraçar o papel de “chefs visionários”, capazes de reinterpretar
a tradição maçónica com criatividade e coragem, para torná-la uma experiência
viva e envolvente, capaz de responder às necessidades dos maçons de hoje e de
amanhã.
Somente redescobrindo a nossa vocação
maçónica, indo além do ritual e abraçando uma experiência autêntica e
significativa, a Maçonaria poderá prosperar no futuro. Uma Maçonaria aberta à
mudança, capaz de atrair e inspirar as novas gerações, será capaz de
desempenhar o seu papel fundamental na sociedade, promovendo valores universais
e contribuindo para a melhoria do mundo.
Fonte: Revista Athanor
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